segunda-feira, 25 de julho de 2016

Os Neguinhos do Educa.


Nos anos 80 veio-nos a paixão pela música e, era uma música tão boa que ela perdura até os dias de hoje, as grandes gravadoras massificaram um estilo dançante, se a Disco havia capturado o coração da classe média, o Funk caiu feito uma luva e acertou em cheio o povo da periferia, na periferia se juntou ao Partido Alto e ao Samba de Raiz e deu uma trilha sonora bem particular.
O grosso desse material, era importado e, não tocava nas rádios, inéditas mesmo, só as equipes de som podiam comprar, curtir salão tinha um preço salgado, alguns moradores da periferia passaram a acumular LPs e a fazer os bailes em casa...abriam as portas de suas casas e davam a qualquer um amante do Funk, o prazer de curtir o som.
Alguns desses verdadeiros difundidores dessa música se fizeram tão bons que, eram obrigados a dar bailes em quase todos os finais de semana e algumas sedes de comunidades cobravam ingressos desse público, que crescia ferozmente.
O chefe do 22 era o Paulo Palaia, um tipo diferente de larista que sabia conversar com os adolescentes e os tratava com o respeito que eles mereciam.
Do começo da Vila Borges ao final do Jd João XXIII, todo esse extenso raio de terra eram domínios dos "Neguinhos do Educa".
Essa designação nos foi dada pelas meninas e, é sobre algumas delas que vou falar, algumas eu vou trocar o nome, haja visto que são agora respeitáveis senhoras de família, algumas até, avós.
A Selma era mais conhecida como Neguinha, cabeleira Black Power e esquia, usava como perfume a essência de patchuli, curtia muito de Betty White e sabia cantar todas as suas músicas, na hora da lenta, quem a tinha nas mãos, podia ouvi-la cantando e gritando em seus ouvidos a linda melodia "Tonight is the Night".
Sobre ela, o Viana dizia:
_São três, os prazeres de dançar com a Neguinha.... Tê-la rebolando em seu corpo, gemendo aos ouvidos e sentindo o cheiro da erva.
A Eliana era filha de pais evangélicos e seu quarto ficava na parte de cima da laje da casa, lá para as 21 horas, íamos ao beco que ficava no fundo da casa dela e a ajudávamos a descer da laje, ali mesmo ela se trocava e fazia a maquiagem no caminho.
Apesar de ser dotada de uma beleza estonteante, os meninos tinham um certo medo dela e nunca ficou com ninguém do bando. Ao final da caminhada, lá pela madrugada, levávamos ela para o beco e a ajudávamos escalar de volta.
A Mari Selma era completamente desvairada, bonita também, só que ao ingerir uma gota de bebida alcoólica deixava de ser uma princesa e se transformava na bruxa do Oeste, era a caçula de 4 irmãos vindos de Pernambuco, hábeis manejadores de peixeiras, que juraram inimizade eterna aos "Neguinhos do Educa".
A Carminha havia sido a esposa do Pivete, famigerado bandido do Jd Amaralina, que se dizia o dono das redondezas, havia tido dois filhos com o dito cujo e esses ficavam aos cuidados dos avós, enquanto ela saía para se divertir em nosso bando. Por vezes, o Pivete enchia a sua Kombi de comparsas e saía cheio de armas à captura de sua propriedade, mas achar-nos, na madrugada era quase impossível, então o Zóinho se deleitava.
Como se pode ver, algumas dessas meninas tornavam o rolê um perigo constante, as madrugadas eram coloridas e eu nem falei da polícia, cerca de quatro gerais por noite.
Mas vivíamos um momento mágico, um momento na história que jamais se repetiria, esses bailes feitos em casa eram uma manifestação de cultura e comunidade, íamos a todos eles com um prazer imenso, em alguns éramos tratados como celebridades, alguns só começavam com a nossa presença e, quanto mais entrávamos nas favelas, quanto mais humilde a sala, maior era a recepção, a batida do Funk ecoava mais limpa quando repercutiam em paredes de Madeirit.

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