terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A casa


Tinha sobrevivido a primeira batalha, (com alguns hematomas, é claro...) mas com moral suficiente para que me admirassem e tivessem medo de mim, por hora estava bom, nenhum espertinho chegaria perto sem temer que eu revidasse, corria à boca miúda que o novão era meio doido.
A consequência disso foi que no dia 17 de Janeiro de 1977 eu conheci a cinta de couro do chefe do 14 e naquela noite de frio, enquanto os internos dormiam seu sono sem culpa, de castigo, eu e o Maninho ficamos em pé no corredor, sob a atenção do vigilante até as 4:30 horas da manhã...e esse era só o primeiro dia.
Começamos no castigo as 7:00 horas da noite, essa era a hora que nos recolhíamos para dormir, no começo entreolhamo-nos com raiva, meu olho inchado e os vergões deixados pela cinta ardiam, mas eu tinha que manter a atitude de defesa e mostrar que se viesse tinha.
Com o passar das horas o cansaço foi nos abatendo e ambos baixamos os ombros, o que antes era desafio agora era fraqueza e o sono ia, aos poucos aniquilando nossa valentia, imaginei que se meu olho doía, o nariz dele idem.
De súbito, ouvimos um ronco...olhamos pra cadeira, no canto do corredor e estava lá, o vigilante(que era irmão do Odilon), cochilando sentado...à medida que o sono vinha ele arqueava a cabeça para frente, de repente ele se recuperava e voltava na posição original, o sono vinha e a cabeça caía, quase batendo na mesa e voltava de novo, tudo isso roncando.Sem fazer barulho me sentei, o chão estava muito frio e minhas feridas doeram, meio contrariado o Maninho fez o mesmo, sentimo-nos aliviados.Descansamos, enquanto nos deliciava-mos com a cena.
Mas durou pouco, esse momento de folga, numa das subidas de cabeça ele virou o olhar em nossa direção, ele nos mirava, mas as pupilas estavam ausentes, como se ele fosse estrábico, tornou a fechar os olhos e caiu com tudo em cima da mesa, o barulho foi estrondante, ele levantou-se assustado, bateu a nuca na parede, caiu sentado na cadeira, que virou-se, estatelou-se no chão e a mesa tombou em cima dele.
Eu juro que fiz de um tudo pra não rir, travei tudo, pra não rir, mas não deu, dêmos (eu e ele), uma sonora gargalhada, enquanto o vigilante se recompunha, nós, abraçados, acabava-mos de rir.
Foi assim que se justificou a segunda surra de cinta que eu e o meu amigo tomamos juntos no mesmo dia(sem contar a que demos um no outro)...Maninho, que mais tarde se tornaria Viana.
Viana, que até a morte dele, trocando tiros com a policia em 1982, foi o meu melhor amigo.

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